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Porquê não dá certo

Fiz na viagem à Indochina um stopover em Cingapura, pequena cidade/país enfiada numa ilhota ao lado da Malásia. Esta parada foi somente para comprovar (e comprovei) que Cingapura é um grande shopping-center dividido em alas de acordo com os interesses de seus moradores/visitantes. Se você deseja algo da Índia, vai para Little India (onde ficam também os “corredores” de eletrônicos que Ciudad Del Este se envergonharia). Se deseja qualquer bugiganga escrita em mandarim o destino é Chinatown. Já as marcas famosas (todas elas) estão lá em Ochard Road, algo como a Rodeo Drive americana ou ainda a Champs Elysieé parisiense. Um luxo!

Cingapura é um país interessante por esta questão do consumismo e também por suas regras extremamente rígidas. Não é permitida a entrada no país com antenas parabólicas de quaisquer tipo, certos jornais e até mesmo, pasmem, chicletes! Em todas as praças, ruas e caminhos você encontra placas dizendo que não pode isso ou aquilo e junto dos sinais (para que qualquer analfabeto possa entender) lá está o valor da multa que, na maioria das vezes é extremamente pesada.

Claro que este tipo de governo “mão de ferro” tem seus prós e contras. Não se vê mendingos nas ruas e tampouco papel no chão (chega a ser vergonhoso jogar algo na rua). Os semáforos, todos organizados, são respeitados tanto pelos pedestres que esperam sua vez nas calçadas como pelos carros que não avançam ou atravessam. Toco de cigarro? Raríssimos são os encontrados. Da mesma forma revistas pornográficas ou propagandas apelativas de qualquer tipo de produto. Um verdadeiro oásis no meio do deserto de baderna que é o sudeste asiático. De outro lado, claro, a sensação de que qualquer deslize pode levá-lo a passar uma temporada na prisão (o que não deve ser ruim em Cingapura).

Neste cenário tentei traçar um paralelo com nossa terra brasilis e fiquei triste ao ponto de pensar em suicídio, o qual não levei adiante com medo da multa que minha atitude poderia acarretar (fiquei com medo da multa pós-morte). Por mais que tentasse não conseguia uma mínima linha lado a lado com Cingapura. Mas será que a questão é o governo mão de ferro, ao contrário do governo de fantoche que estamos tendo há décadas em nosso país? Ou seria o tamanho do país? Quem sabe por ser uma ilha? Ou por eles terem olhos puxados?

Biblioteca Nacional de CingapuraA resposta veio em uma das caminhadas que fiz pela cidade quando me deparo com o prédio da Biblioteca Nacional. Neste momento compreendi a verdadeira diferença entre o Brasil e Cingapura. Enquanto nós temos uma biblioteca esquecida pelo governo, agonizante e vivendo de migalhas, eles possuem um prédio de 15, isso mesmo QUINZE andares em um quarteirão que encerra mais de 8 milhões de obras de todos os tipos possíveis e imagináveis. Um verdadeiro panteão de conhecimento e que realmente é usado pela população como pude constatar in-loco.

Alguns vão advogar que nossa biblioteca ainda é maior (9 milhões de obras) ou que temos a maior da América Latina. Aí pergunto eu: “e daí?” Quem é que tem acesso ao conhecimento lá guardado? Quem é que sabe onde fica a Biblioteca Nacional de nosso país? E quem é que sabe para que ela serve? A diferença pode também ser observada nos slogans dos dois governos: excelência – serviço – integridade lá em Cingapura enquanto nós ficamos com o demagogo “um país para todos”. Só faltou mesmo colocar entre parênteses “os banqueiros”. Lamentável.

Não é de hoje que educação é o principal diferencial entre nações desenvolvidas e sub-desenvolvidas. Sem investimento nesta área nossos cérebros descem pelo ralo na tentativa de encontrar um pouco de água fresca em outros rios e para nós sobra o lodo do senado apinhado de mentirosos, traidores (das mulheres e da pátria) e ladrões, bem como um governo que chega ao limiar do “rouba mas faz”. Para fechar com chave de ouro, donos de faculdades de fundo de quintal que desfraldam a bandeira do “tudo por dinheiro“, independente da forma que este venha. O resultado é a cíclica retórica do pacote de biscoito “não sabe votar porque é burro ou é burro porque não sabe votar”?

Enquanto isso, lá no fim do mundo existe uma nação com cinquenta anos de independência, um crescimento de 8% ao ano, absurdos 1% de inflação anual, 3% de desempregados e uma renda per capita igual as quatro maiores potências mundiais. Será que a biblioteca infui nisso, ou não?

Um sonho de criança

Criança normalmente sonha com monstros que as amedrontam, com coisas que não gostaria de fazer ou ainda com aquelas chamadas de impossíveis. Quem é que nunca sonhou em bater no moleque mais chato da turma (só que ele era grandão)? Ou não sonhou com o bicho papão por causa do escuro? Ou ainda em poder ser como um super-herói da TV ou ainda não ir para a escola. Duvido que os sonhos de crianças não sejam assim até hoje.

No meu caso sonhava com isso, claro. Mas também sonhava com outras coisas que, naquela época, eram impossíveis para mim. Sonhava em andar de avião, em conhecer vários lugares diferentes, em ver coisas novas. Fui crescendo e os sonhos não acabaram, ao contrário, se tornaram maiores, mais distantes, mais ousados.

Um deles vem de berço. Meu velho, comunista de carteirinha (realmente), possuía a teimosa mania de comprar livros. Livros de história, de artes, de ciências. Assim sempre tive acesso à livros e tomei gosto pela coisa, seja para ler ou para escrever. De outro lado, minha velha, professora de história, contava coisas interessantes sobre o mundo que me deixava boquiaberto e pensativo no quanto nosso mundo era grande. E deste tempo e da mistura dos dois veio um sonho enorme.

O sudeste asiático, principalmente a chamada Indochina sempre me foi um fascínio, fossem pelos livros de história ou ainda pelos filmes que naquela época somente mostravam a visão unilateral dos americanos. Desta época já vinha minha indignação de que não seria possível serem tão bonzinhos e os “chinas” serem tão maus, o que se mostrou totalmente inverso nos anos vindouros com a verdade sendo conhecida por outras fontes. Mas além desta visão, recordo-me das cenas e imagens dos arrozais sendo bombardeados por napalm, as casamatas, as multilações. Um período rubro-negro pelo qual alguns povos passaram nas mãos da “polícia do mundo”.

Quando tinha 13 anos prometi para eu mesmo que iria um dia pisar nesta parte do mundo para ver de perto o que tornou-se prazer para os franceses durante muito tempo e o que foi palco de uma das maiores atrocidades humanas depois da segunda guerra. O Vietnã, Laos e Camboja, países que nada são para a maioria das pessoas mas que possuem uma história milenar vinda desde os mongóis até os descendentes de Buda que mesclados criaram um povo extremamente rico em cultura e arte. Neste caldeirão multiracial e multicultural eu mergulho para realizar dois terços deste sonho de criança.

O roteiro é simples: algumas escalas em cidades-chave (Kuala Lumpur e Bangkok) até a fronteira entre a Tailândia e Laos, já diante do rio Mekong e de Vientiane, a capital laociana. De lá, Luang Prabang, pequena cidade ao norte do país considerada patrimônio mundial pela UNESCO e depois a entrada no Vietnã por Hanói. Alguns dias ali e parto para Ha Long Bay (outro patrimônio mundial) e Sapa, na fronteira com a China (que não vou entrar pelo menos a princípio). Voltando para Hanói desço para a antiga Saigon (hoje Ho Chi Mhin) onde pretendo conhecer algumas casamatas da época da guerra. Finalmente, Cingapura para uma parada estratégica e a volta para casa.

Mapa da rota

Toda a viagem soma mais de dez mil quilômetros de vôo, doze cidades e vinte dias, o que é pouco para conhecer tão deslumbrante local de nosso planeta. Os preparativos já estão quase prontos, faltando somente receber o visto de entrada no Vietnã e fechar a mala. Então ainda dá tempo de contar aqui um pouco mais sobre esta viagem antes da partida.Aguarde cenas dos próximos capítulos. Vai ser sensacional!